segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Toda a manhã...


Toda a manhã

fui a flor impaciente por abrir.
Toda a manhã

fui ardor do sol no teu telhado.
Toda a manhã

fui ave inquieta no teu jardim.
Toda a manhã

fui ave ou sol ou flor secretamente ao pé de ti.



Eugénio de Andrade

domingo, 5 de agosto de 2007

Homens que são como lugares mal situados


Homens que são como lugares mal situadosHomens que são como casas saqueadasComo são como sítios fora dos mapasComo pedras fora do chãoComo crianças órfãsHomens sem fuso horárioHomens agitados sem bússola onde repousem
Homens que são como fronteiras invadidasQue são como caminhos barrica dosHomens que querem passar pelos atalhos sufocadosHomens sulfatados por todos os destinosDesempregados das suas vidas
Homens que são como a negação das estratégiasQue são como os esconderijos dos contrabandistasHomens encarcerados abrindo-se com facas
Homens que são como danos irreparáveisHomens que são sobreviventes vivosHomens que são como sítios desviados Do lugar
Homens que são como projectos de casasEm suas varandas inclinadas para o mundoHomens nas varandas voltados para a velhiceMuito danificados pelas intempéries
Homens cheios de vasilhas esperando a chuvaParados à esperaDe um companheiro possível para o diálogo interior
Homens muito voltados para um modo de verUm olhar fixo como quem vem caminhando ao encontroDe si mesmoHomens tão impreparados tão desprevenidosPara se receber
Homens à chuva com as mãos nos olhosImaginando relâmpagosHomens abrindo lumePara enxaguar o rosto para fechar os olhosTão impreparados tão desprevenidosTão confusos à espera de um sistema solar.Onde seja possível uma sombra maior...